Entrevista Geraldo Melo Filho


Active ImageCriador destaca resultados positivos e evolução consistente da  raça

“De todas as provas de ganho de peso organizadas pela ABCZ [Associação Brasileira de Criadores de Zebu], com a participação de todas as raças, o Guzerá ganhou 70% das provas que participou”, afirma. “Os números do Guzerá o sustenta. Você não precisa falar que são 6.000 anos de história”, complementa.

Criador destaca resultados positivos e evolução consistente da raça

Com o objetivo de trazer mais informações aos criadores da raça Guzerá, e desta forma contribuir para o aprimoramento da atividade, o site do Guzerá da Capital inicia uma série de entrevistas com criadores de expressão. Tudo isso para aumentar o nível de informação de quem se dedica à criação de Guzerá, atividade que está em constante expansão e que se revela sucessivamente como um investimento vantajoso.

O primeiro a falar conosco é Geraldo Melo Filho, que tem experiência com o Guzerá desde 1983. Seu rebanho é “basicamente uma mescla dos rebanhos CP e JR”. Entre 1983 e 2001 (ano que os animais saíram do Rio Grande do Norte), o rebanho dos Melo foi eleito nove vezes como melhor criador da região. Atualmente, alguns de seus bovinos estão no Pará. Contudo, a maior parte está em Brasília (DF) e Unaí (MG). Considerado uma “enciclopédia” da raça, ele ressalta que, comparado com outros zebus, “o resultado financeiro do Guzerá é muito melhor”.

“De todas as provas de ganho de peso organizadas pela ABCZ [Associação Brasileira de Criadores de Zebu], com a participação de todas as raças, o Guzerá ganhou 70% das provas que participou”, afirma. “Os números do Guzerá o sustenta. Você não precisa falar que são 6.000 anos de história”, complementa.

Nesta conversa, ele traz um pouco da trajetória do aprimoramento genético do Guzerá, desde a década de 60, até os atuais resultados práticos: “recordes de preço” e “bezerros melhorados”. “Ano após ano vemos uma evolução consistente, já que a raça aumenta a oferta e aumenta o preço. Se você olhar a trajetória recente das raças Zebu, talvez o Guzerá seja a raça que está no passo mais seguro”, destaca.

Confira a entrevista, que está dividida em tópicos, e que conta com a participação de Adriano Varela e Brilhante Neto, responsáveis pelo Guzerá da Capital.

Resultados

Geraldo Melo Filho - Em termos de resultados, de provas zootécnicas e de avaliações genéticas, nenhuma raça zebu tem tantos números quanto o Guzerá tem. De todas as provas de ganho de peso organizadas pela ABCZ (Associação Brasileira de Criadores de Zebu), com a participação de todas as raças, o Guzerá ganhou 70% das provas que participou. Mesmo com o efetivo de número de animais muito menor. O Guzerá já foi uma raça dominante, e depois foi praticamente dizimada com a introdução do Indubrasil. E o Nelore, atualmente, é a grande raça dominante devido ao número de animais. Então, mesmo com a quantidade de animais muito menor do que o Nelore, o Guzerá ganhou 70% das provas de ganho de peso. E a ABCZ fez uma única prova de conversão alimentar, entre outras características além de ganho de peso. E o Guzerá ganhou também. Os números oficiais mostram isso. A maioria das provas de ganho de peso do Instituto de Sertãozinho dos últimos anos também têm sido vencidas pelo Guzerá. O Instituto de Zootecnia (IZ), em Sertãozinho (SP), é vinculado a Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (SAA).

Brilhante Neto – Tem um outro detalhe da raça. A vaca Guzerá dá leite. Então, para o criador que exerce essa atividade, além dele manter o leite, ele ainda tira bezerros diferenciados.

Melhoramento genético

Geraldo Melo Filho - Você faz melhoramento genético visando leite ou carne. Não tem outra coisa. Então, em última instância, quando se faz melhoramento genético, você está pensando em fazer um trabalho que permita ao criador que produz carne produzir bezerros mais pesados, com o acabamento do corte o mais cedo possível. Ou, para o criador que tira leite, produzí-lo com rusticidade, no caso do Guzerá. Porque se você for para a produção leiteira intensiva, o holandês será imbatível em qualquer condição do mundo. Na condição brasileira, disputando leite à pasto, o Gir e o Guzerá são as duas principais raças. Então, como fazer para que o melhoramento genético “chegue na ponta” ? A partir de dois caminhos. Ou sêmen, ou, em 90% das vezes, tourinho. O grande produto nosso, de qualquer criador, e é o que cumpre a sua função dentro da cadeia da pecuária, é o produto que é utilizado na ponta. O que nós vendemos é isso. É uma semente, é um insumo. Eu vendo um touro melhorado, que o pecuarista vai usar nas suas vacas para produzir um bezerro melhorado. Assim como alguns agricultores compram uma semente de milho melhorada, paga um diferencial de preço, porque ela vai produzir mais sacos de milho por hectare. E o tourinho do Guzerá cresce de preço ano após ano. A Lagoa da Serra, uma das principais centrais de inseminação artificial do Brasil, fez no final de 2007 uma prova de ganho de peso. Na verdade, foi um grande teste de avaliação de touros. E nesse teste havia touros de todas as raças. Era uma prova muito grande, tinha toda uma cobertura de mídia. Terminada essa prova, eles fizeram um leilão dos animais que foram melhor avaliados. De todas as raças. A raça com maior média de preço foi o Guzerá. E isso é uma coisa que recorrentemente ocorre.

A publicação Canal Lagoa (ano 9, número 26, de dezembro de 2007) traz claramente esses números. “A raça Nelore registrou média de R$ 5.490,00, enquanto o Nelore Mocho ficou com R$ 6.698,66. A raça Guzerá obteve R$ 7.126,66 de média; o Brahman ficou com R$ 4.160,00; e o Tabapuã, R$ 4.186,66”, diz a publicação. “As avaliações do CP Lagoa alcançaram os objetivos propostos. Reunimos 336 animais, de 105 criadores de vários Estados e, dentre esses, 135 obtiveram índices positivos e foram para o leilão. Todos foram avaliados em 12 características durante os 180 dias de confinamento. Os compradores tiveram a tranqüilidade de adquirir animais certificados, com garantia de resultado e que farão diferença em seus plantéis”, avalia Ricardo Abreu, gerente de produto Corte/Zebu da Lagoa.

Geraldo Melo Filho – Vamos imaginar que um tourinho Guzerá vale o mesmo que um Nelore. Normalmente, o Guzerá vale mais. A média nacional é que o tourinho Guzerá é vendido mais caro do que todas as outras raças. Mas vamos imaginar que sejam todos iguais. Para começar na raça Guzerá, você compra matrizes de muito boa qualidade, que servem para ser doadoras, para qualquer plantel. Você compra essas vacas por R$ 25 mil, R$ 30 mil. Boas vacas, vacas que podem ser multiplicadoras. E essa vaca vai lhe produzir, ao longo de 1 ano, uma quantidade “X” de produtos, e esses produtos serão vendidos. E o produto que vai normalmente ao mercado são os tourinhos. Então você compra uma vaca de R$ 25 mil que vai produzir tourinho de R$ 3 mil. Mas você tem uma outra opção. Você pode comprar uma vaca de R$ 1 milhão, que vai produzir tourinho de R$ 3 mil também. O que é que dá melhor resultado? O produto é o mesmo. O resultado financeiro do Guzerá é muito melhor. Mas tem quem diga: “Ah, fulano comprou uma vaca e tirou um bezerro que valeu R$ 1 milhão”. É como quem tira na loteria. A loteria não é uma análise econômica de uma atividade. Mas o real da atividade é o seguinte: você produz tourinho para vender. Seus tourinhos vão valer R$ 3mil. Custe a mãe deles R$ 25 mil ou R$ 2 milhões. Você escolhe o que é melhor negócio.

Adriano Varela – A atividade de criação de gado puro é uma coisa interessante. Primeiro, você tem que gostar, uma  vez que exige dedicação. Segundo, a atividade tem que ser rentável. Porque, se não, ela vira hobbie. E aí poucos podem manter. Se você chegar para qualquer criador e disser que esse é um investimento alto, é verdade. Se disser que a curva de retorno é longa, é verdade. Mas o empresário sabe dimensionar isso tudo. Ele sabe dimensionar um investimento, uma curva de retorno, etc. O que ele não sabe dimensionar é hobbie. O Guzerá hoje é uma alternativa interessante de investimento. Está em franca expansão, já que o rebanho nacional do Guzerá é muito pequeno.

Geraldo Melo Filho -  Existe um mercado muito grande ainda a ser conquistado.

Brilhante Neto – A demanda é crescente. O potencial é enorme.

Geraldo Melo Filho - Quando se está trabalhando certo, corretamente, em média, a geração seguinte é superior à média da geração anterior. Porque se está fazendo melhoramento genético. Então você evolui a cada geração. Uma grande matriz tem que deixar filhas. Não adianta você recorrer a clone, que é a manutenção do que você já tem, e não o passo seguinte. Então, o grande produto, de uma grande marca, de uma grande matriz, são as suas filhas e não o seu clone. O clone anda para o lado. Se você estiver trabalhando certo, as filhas são o passo seguinte. Se você confia que está trabalho no rumo correto, que está efetivamente fazendo melhoramento, você pode vender suas vacas boas, na medida em que você tiver filhas delas. Porque, em tese, as filhas, na média, são melhores do que as mães.

Expansão do número de criadores

Geraldo Melo Filho - Se você pegar o número de criadores novos, verá que houve uma evolução muito grande. A raça evoluiu em número de animais ofertados, em preço médio, ano a ano, consistentemente. Você vem num ritmo em que a cada ano dá um passo. E os passos são significativos. Não tem como, por exemplo, dobrar o número de animais de um ano para o outro. Existe uma capacidade física, uma vez que as vacas vão parir o bezerro. Mas ano após ano vemos uma evolução consistente, já que a raça aumenta a oferta e aumenta o preço. Se você olhar a trajetória recente das raças Zebu, talvez o Guzerá seja a raça que está no passo mais seguro, no passo mais consistente. É uma raça que não tem “oba-oba”, que não tem preços incompatíveis com a realidade pecuária. Mas que vem tendo resultados melhores do que outros animais. Agora, com um crescimento natural, normal e real. Não se vê no Guzerá arranjos de pesagem. Outras raças tinham peso muito baixo e, de repente, passaram a ter peso muito alto. Isso é sustentável? Como é a realidade de mercado para uma raça?  É duvidoso. No caso do Guzerá, você tem, ano após ano, a raça subindo de preço, batendo recordes de preço. Mas recordes razoáveis. Bom preço para quem vende e preço que, para quem comprou, vai conseguir tirar o investimento.

História recente do Guzerá    

Geraldo Melo Filho – No final dos anos 60, vemos os primeiros efeitos do gado importado na raça Guzerá. O Leôncio Andrade era dono dos melhores animais importados. Ele detinha uma genética diferenciada e foi, naquele momento, um criador diferente. Fez grandes campeãs nacionais. Passa isso, e temos a fase dos criadores nordestinos. Humberto Almeida, João Roberto Leite, Ana Rita... E então chega a Camilo Collier, que era um grande investidor. Na verdade, o time dele era imbatível, porque tinha tudo de bom de todo mundo. Tinha um animal bom, ele comprava. Em meados dos anos 80, Camilo foi importantíssimo na história da raça. Foi presidente da associação e foi a primeira pessoa que entrou na entidade e quis dar uma visão de marketing. Foi o primeiro a reconhecer a importância de fazer um bom leilão em Uberaba (MG).  Ou seja, ele ousou. Por acaso, não deu certo o leilão em Uberaba. Mas foi a primeira iniciativa, coisa que até hoje nos estamos brigando para que seja feito, e bem feito. Camilo morreu em 1988. A morte dele deu um baque... Depois disso, a raça passou por um período de indefinições. Aí surge Amílcar Farid Yamin. Grande empresário, das Indústrias Corona, um cara de muito sucesso e um pecuarista muito bom, com uma fazenda no Pará muito grande que faz pecuária de corte. Tudo que ele faz, e fez, ele faz bem feito. Ele criou Holandês, era o melhor criador do Brasil. Ele criou Pardo Suíco, era o melhor criador do Brasil. Ele criou Limousin, era o melhor criador do Brasil. E entrou no Guzerá. Então ele entrou no Guzerá e mudou o patamar de prática. Ele ensinou o criador de Guzerá a tratar de gado. Então o gado Guzerá era visualmente, em uma exposição, um antes de Amílcar. Depois de três anos, ele já tinha colocado todo mundo no bolso, e as pessoas aprenderam: ou passavam a tratar do jeito que ele tratava, ou...  Então ele é o responsável pela mudança no padrão de apresentação do gado. Ou seja, profissionalizou a questão de como mostrar o animal. E depois dele, temos uma série de pessoas, que vêm até o ciclo atual. Atualmente há um grupo muito grande, uma mudança para o sentido empresarial do negócio. Vários empresários e várias pessoas disputam espaço. Isso tudo sem tirar o mérito dos antigos. Temos grupos de criadores de 40, 50, 70 anos de tradição, que continuam criando e que são a base genética de todos esses que a gente falou. Com maior ou menor participação, em um momento ou em outro, todos eles estiveram presentes.